terça-feira, 16 de junho de 2015

Dez de Junho, ou d' A Vergonha.

Por Onónimo Quiescente

sem legenda possível



Citação


«Fernando Teixeira dos Santos, que tutelou a pasta das Finanças entre 2005 e 2011, nos governos socialistas de José Sócrates, vai ser condecorado com a Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo.
Teixeira dos Santos vê a condecoração como reconhecimento do “serviço prestado ao país”».

«O Sr. Presidente veio reconhecer o mérito dessa decisão [pedir auxílio à troika] que foi um serviço prestado ao país. Teve o privilégio de o reconhecer na minha pessoa o que me deixa muito honrado».

Presidência da República
«A Ordem Militar de Cristo destina-se a distinguir destacados serviços prestados ao País no exercício das funções de soberania».

«Considero, por isso, que as Ordens Honoríficas Portuguesas são não apenas um testemunho da nossa História mas também um instrumento essencial para o Estado manifestar o seu apreço pelos que se notabilizam nas mais diversas áreas».
(Presidente em exercício desde 2006, Primeiro-Ministro entre 1985 e 1995)



Opróbrio


Poderia falar da Vergonha, essa ferida perene exacerbada na agonia de cada 10 de Junho, o dia da comenda. Poderia falar dos méritos da Democracia Republicana e da repugnância nauseante desta “democracia republicana”

Poderia falar de grupos de interesse, de organizações partidárias, da paródia parlamentar, dos sindicatos, dos comentadores políticos, de cada arauto e factótum cuja presença nauseia, de néscios e de títeres, da maçonaria e da opus dei, de sociedades de advogados, de aventais e da exorbitância anual despendida em pareceres jurídicos, da comissão legitimada pela consultoria e pelos paraísos fiscais, dos Bufarinheiros da Pátria. 

Poderia falar de uma comunicação social que confortavelmente se deixou amordaçar, de uma justiça intencionalmente convertida no paradigma da ineficácia, da mórbida obesidade autárquica, de autoridades reguladoras em eterna vénia partidária, do comboio apinhado de gente que passa os dias a olhar para o alto, sonhando.

Poderia falar de juventudes partidárias, esses aviários de ministros na pena arguta e implacável de Pulido Valente, do ferrete ígneo de incapazes que há-de obliterar este País. Poderia falar da prolixa legislação que brota da AR, de papel higiénico expelido no sanitário em dia de gastroenterite, das estatísticas cor-de-rosa e da leviandade do termo desempregado no discurso político. 

Poderia falar da celeridade unânime que une partidos no seu próprio interesse de financiamento e da lentidão exasperante na implementação de qualquer reforma política. Poderia falar dos terríveis monopólios públicos que foram convertidos em salutares monopólios públicos de ditaduras além-mar, uma espécie de castigo colonizador por séculos de pecado esclavagista. Poderia falar de Angola e da Guiné Equatorial, de suspeitas apenas sussurradas acerca de malas diplomáticas, de gente que vem das Beiras e chega ao céu, de incólumes e de inimputáveis. 

Poderia falar do desprezo que toda esta gente demonstra, por acção e por inacção, em relação à População e à dignidade do Estado. Poderia evocar a imagem que mortifica o espírito, a carcaça exangue de um enorme paquiderme atormentada por uma corja de vermes, lacraus e hienas vorazes, de um corpo cuja mente já desapareceu. Poderia mencionar a jangada de pedra do excelente Saramago, mas num outro sentido: o da pedra quase invisível que cada um de nós tem amarrada ao tornozelo enquanto o abismo se aproxima.

Poderia recordar o mérito silencioso do voto nulo, de um a mil, de mil a um milhão. 
Poderia falar da Vergonha e poderia falar da Falta de Vergonha.

Poderia. Mas não falarei. Não é necessário. 
Ficou tudo dito logo no início, na imagem.


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9 comentários:

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    1. Olá cara U.!
      (voar valeu mesmo a pena! sejas bem regressada! ;)

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  2. Servem-se os que juraram servir.

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    1. Talvez O problema deste (e tantos outros...) País, a falta de gente séria na política. Depois poderíamos pedir gente inteligente, mas para já bastava gente séria, sem dinossauros.

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  3. Tornam-se todos o senhor comendador... Já dizia o sábio Abel Xavier, "o treinador, treina a dor", e digo eu, estes comem da dor. Da nossa... Palhaços...

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    1. Anualmente a mesma paródia, a classe política a premiar o seu próprio 'mérito'. Já várias vezes foram longe de mais. Mas este ano quando me contaram uns dias antes pensei que estavam a brincar comigo.

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  4. Estas condecorações valem o que valem. O Zeinal também recebeu a de Mérito Empresarial e um dia destes é o Jorge Jesus que recebe a Ordem da Instrução Pública.
    Pessoalmente, acho que a Erica Fontes já merecia a Ordem do Infante D. Henrique.

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    1. A Grã-Cruz para o Jasus e o Grande Colar para a Erica.

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    2. :DDDDD
      e a Torre e Espada para o Bruno de Carvalho.
      (as minhas desculpas aos adeptos, não consigo conter-me, até gosto do Bruno de Carvalho e do Jesus, mas o BC recorda-me o Marinho Pinto num momento mau ;)

      não conheço a Erica mas sinto que estou a perder algo de valor!

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