quarta-feira, 12 de julho de 2017

O Avô, os Incêndios, as velhas Armas e a Paz Social

O Avô desta nossa Pátria, sempre exultante na interpretação heróica da História, encontrou na mansidão das suas gentes um pretexto para cunhar um novo atributo com o qual presentear o Povo.

É um hábito inerente ao cargo. Fora-nos outrora gentilmente oferecido o termo "magistratura activa de influência", pelo anterior "homem do leme", lá longe, no seu saudoso eremitério, gravando a ferros as palavras ensimesmadas que brotam para a sua vingativa biografia política e para o tédio dos seus roteiros, sempre de belas tonalidades, aquecendo-nos o inverno no interior da lareira.

O Eremita Silencioso, mais louvado pela tranquilidade da sua ausência que pelo disparate provinciano da sua sempre inoportuna oratória, conseguiu deixar ao seu sucessor, O Avô, um imenso espaço político por explorar, o da "Proximidade ao Povo". Ah, O Povo. O povo rústico, o povo católico, o povo de bem, o povo que aplaude a sua simples presença enquanto animador de serviço.

E assim, O Avô, que tanto teria a dizer acerca da infeliz situação a que este País chegou, lá se dedicou ao Abraço, à rápida inauguração seguida de outra ainda mais rápida festividade. Terá abraçado já para cima da centena de milhar de concidadãos.

Sabemos que terá de ser afoito. Seu netinho avisara com antecedência, "Avozinho, é só um mandato!", e Avozinho bem se esforça.

Na visão do mundo que perece herdada do tempo que passou enquanto potencial delfim, aguardando a limusina que haveria levá-lo à então presidência do conselho, O Avô trouxe consigo o prazer pela "Paz Social" e pela "'Descrispação' Política" neste País de tépidas águas partidárias, porteiros do regime, e grupos de interesse acomodados no eterno "mexer muito é estragar".

E não é que, nesta bonomia, orbitando como apraz a qualquer anjo zelador, acabou, O Avô, agrilhoado à implacável e sempre incómoda realidade?

Continuamos no lixo, embora um lixo um pouco mais sólido na percepção, que, infelizmente, ainda não coloca pão na mesa.
Temos de crescer mas não há maneira, enfiados como estamos neste complexo de Peter Pan tutelado por figurar patriarcais.
Após décadas de subsídios continuamos de mão estendida e sem infraestruturas, aguardando que as estórias sejam substituídas pelas verdades.

Ocorre uma tragédia nacional, irrepreensivelmente acompanhada pelo Avô, é certo, justiça lhe seja feita, carregando às costas a incompetência e dolosa inércia dos "serviços políticos" que tutelam a protecção civil, causa indirecta de seis dezenas de compatriotas vítimas do horror.

Havia uma árvore, havia um trovão. Garantidamente.
Estava tudo a arder e a pobre árvore já havia sido identificada.
Mas nem o relâmpago chegou à árvore nem o trovão passou por ali.

Sente-se a narrativa oficial vacilar.
É triste, tantos políticos e subalternos a remar para o mesmo lado e afinal não houve relâmpago àquelas horas nem naquele local.

No entanto, ficamos com cinco por cento de probabilidade de o incêndio ter deflagrado como consequência de um relâmpago(?!). Pode até ter-se tratado de uma linha de alta tensão e de uma outra pobre árvore ainda por identificar.

O salta pocinhas que governa esta república estudantil, tal é o caos, desorganização e aparente abuso de substâncias, explicou detalhadamente o fenómeno da trovoada seca na complacência da comunicação social, ainda antes de aparecer um monte de gente, malditos pessimistas, provavelmente em delírio colectivo, a afirmar que trovoada não, só "muito mais tarde e muito longe".

Afinal não demos todos as mãos. Alguns preferiram dar combustível ao mato.

Quando já o próprio sempre jovial Avô se preparava para um retiro de meditação, orbitando por reinos além mar, outro escândalo se abate sobre o País.
Salta pocinhas, óbvio optimista segue para banhos. Crises nacionais são coisa de secretário de estado para baixo.

Tanto alarido criado porque aparentemente já não se pode ir a um paiol das forças armadas não vigiado arranjar pirotecnia para o próximo S. João.

O Avô, apesar de cansado com os seus voláteis súbditos, ainda arranja tempo para ver dois dos grandes, dos maiores, heróis nacionais deste povo rústico.
E, desilusão sobre desilusão, ouve Salvador divagar acerca dos sempre incómodos gases intestinais, e Ronaldo, O Rei, "melhor jogador do mundo, vírgula", amuar por não disputar a final. Compreende-se. Maldito jogo, indigno da presença d'O Melhor do Mundo, aquele que trata Presidentes da República por "você". Santinhos, cabisbaixo na conferência de imprensa, é o retrato da desiludida falta de autoridade, com ar de quem também já quer vir embora. Bastava ter pedido ao Mendes.

E agora, caro Avô, agora que os próprios militares ameaçam protestos, onde irá o meu caro pendurar a bandeira da Paz Social?
Agora que morreram dezenas de pessoas por inépcia, incompetência, procrastinação, desinteresse de políticos de sucessivos governos e seus delegados políticos em organizações operacionais de carácter técnico.
Agora que uma PPP se mostrou não apenas ruinosa para as financas publicas mas mortífera!
Agora que "desapareceram" dezenas de quilos de explosivos plásticos e respectivos detonadores (guarda-se a chave do cofre em cima do próprio cofre), mais de uma centena de granadas ofensivas e dezenas de lança granadas (quem sabe se não terá sido um pobre tuaregue no seu solitário dromedário a passar na velha abertura da cerca).

E agora, meu caro?! Onde está a Paz Social? Onde está a "descrispação" e a "cooperação institucional"?!

A ajuda às Pessoas, para tentarem refazer as suas vidas devastadas, vai demorar tanto como é usual? Ou seja, 'nunca'?

Não sendo tudo negativo, tivemos hoje o regresso do filho pródigo às câmaras televisivas, ar grave adequado às circunstâncias, enquanto o chefe de estado maior general proferia, alguma aflição visível, própria de quem pouca convicção tem naquilo que diz, as mais bárbaras trivialidades.

Afinal foi coisa de pouca monta, pouco mais de trinta mil euros em material de guerra, como se fosse o custo dos explosivos que nos preocupa, dezenas de lança granadas prestes a serem abatidos ao efectivo, umas palavras incoerentes acerca de a segurança não ser da exclusiva responsabilidade das forças armadas, de termos de estar todos envolvidos e de ser necessário responsabilidade acerca das "câmaras".

Quais câmaras, Senhor General?!
As câmaras municipais? A video vigilância das estruturas das forças armadas? Os drones nos corredores da aviação civil? O problema de a Internet estar completamente poluída por selfies desfocadas e fotos de orientação vertical?

Quais câmaras, Céus?!

Os explosivos plásticos também estavam fora do prazo de validade? As granadas ofensivas eram de brincar? Os terroristas vão ter uma grande surpresa quando tentarem utilizar os lança granadas de brincar à português?!

É isso? É como os três cafés diários que "reduzem o risco de morte"? Outra pérola da nossa "comunicação social".

Podemos abrir os paióis à iniciativa de voluntários para levar aquela velha tralha inoperacional toda para a sucata?!

Minha nossa Senhora!
Este País é, e tem sido sempre, liderado por uma súcia de incompetentes de duvidoso carácter e pouca vergonha, que ainda tentam fazer-nos passar por parvos com as estórias da carochinha que conjuram.

Meus Senhores, tenham Vergonha!
Nem que seja poucochinha.

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